Pesquisadores do Instituto de Biociências de Botucatu, da Universidade Estadual Paulista (IBB-Unesp), desenvolveram um novo biomaterial que acelera a diferenciação de células que produzem ossos – conhecidas como osteoblastos. O resultado se mostrou promissor para uso futuro em processos de regeneração óssea, podendo ser empregado, por exemplo, em enxertos e recobrimento de implantes.

O estudo mostrou que o desenvolvimento de um fosfato de cálcio – molécula com estrutura semelhante ao mineral ósseo – carregado (dopado) com cobalto é capaz de estimular a diferenciação dos osteoblastos. O resultado foi publicado no Journal of Biomedical Materials Research.

“Nossos dados reúnem, pela primeira vez, evidências suficientes baseadas na hipóxia [baixa concentração de oxigênio] de que podemos ter um novo material biomimético com perspectivas de regenerar o tecido ósseo. Em enxertos nem sempre há condições de quantidade e qualidade suficientes para que o osso autógeno [removido do próprio paciente para enxerto] seja usado na clínica”, afirma à Agência FAPESP o biólogo e professor Willian Fernando Zambuzzi, responsável pelo estudo.

Atualmente, tratamentos para pacientes que precisam de enxerto, seja por fraturas, por intervenções para retirada de tumores (ressecção) ou mesmo em próteses dentárias, acabam usando fragmentos de ossos provenientes do próprio indivíduo. Esse processo, no entanto, demanda cirurgias adicionais para a obtenção do material autógeno, com aumento do risco de infecções e maior tempo de convalescença.

Pesquisador da biologia do osso desde os anos 2000, Zambuzzi tem apoio da FAPESP e é orientador do doutorando Gerson Santos de Almeida, primeiro autor do trabalho. Segundo o professor, o grupo tem buscado conhecer moléculas e mecanismos envolvidos no desenvolvimento ósseo e sua relação com biomateriais.

Nos últimos anos, com o aumento da expectativa de vida da população, processos regenerativos do tecido ósseo têm sido alvo de pesquisas no mundo todo e de busca por terapias mais eficazes, visando restabelecer o paciente rapidamente, reduzir o tempo de internação, os custos do tratamento e eventuais efeitos colaterais. Entre as linhas de estudo estão o desenvolvimento de materiais que repliquem com similaridade, segurança e eficiência a complexidade da estrutura óssea.

Construção de conhecimento

Em 2014, estudo liderado pelo pesquisador Ralf Adams, do Instituto Max Planck (Alemanha), e publicado na revista Nature mostrou que células endoteliais – que revestem os vasos sanguíneos – têm capacidade de estimular a diferenciação de osteoblastos, apontando sincronia entre elas. A partir desses achados, Zambuzzi, que à época tinha apoio da FAPESP por meio de um Auxílio à Pesquisa – Jovens Pesquisadores, começou a desenvolver essa linha de estudos no então recém-criado Laboratório de Bioensaios e Dinâmica Celular.

Com base nos resultados prévios somados à literatura, o professor trabalhou com a busca por moléculas que estimulassem o crescimento de vasos sanguíneos, visando um efeito indireto na diferenciação dos osteoblastos. Chegou ao cloreto de cobalto (um sal), que conhecidamente estimula a hipóxia e leva o organismo a aumentar o número de vasos sanguíneos para tentar suprir a ausência de oxigênio.

“A hipóxia acontece naturalmente nos tecidos. Conhecendo seu desenvolvimento e a relação de células endoteliais com as ósseas, entramos nos aspectos biomiméticos. A partir daí, resolvemos provocar artificialmente uma molécula nova – o sal dopado com cobalto – para que pudesse estimular a produção de ossos, como um efeito complementar ao aumento da angiogênese”, explica o professor.

Com base em normas de avaliação biológica (ISSO 10993:5), os testes mostraram que não há toxicidade do novo material. Além disso, a quantidade de cobalto foi decisiva na definição da concentração ideal para aplicações biomédicas futuras, abrindo novos horizontes em medicina regenerativa. “Os resultados são conclusivos na pesquisa básica e nos habilita a buscar modelos pré-clínicos mais complexos de análise buscando melhor compreensão translacional desses achados, como testes em animais”, afirma Zambuzzi.

De acordo com o professor, seu grupo tem buscado estabelecer modelos biológicos in vitro com base no chamado “Princípio dos 3 R’s” – que em português significa redução, substituição e refinamento –, mas se convence da necessidade de modelos que preservem a fisiologia dos vertebrados em alguma etapa do desenvolvimento de novos produtos.

“Estamos no caminho de desenvolver novos materiais biomiméticos que satisfaçam a qualidade de vida das pessoas, dando a devida importância ética ao uso de animais de experimentação”, conclui.

Texto: Luciana Constantino | Agência FAPESP