Um dia, em 1965. Porque, sempre que posso, escrevo sobre As Voltas Ciclísticas de A Gazeta Esportiva? Ofereço esse texto para o Prof. Pereira.

 

       Esse texto a seguir tem uma razão. Escrevi-o quando da passagem da Volta Ciclística, organizada, então, pela Rede Globo. Foi uma homenagem ao professor Pereira, secretário de Esportes de Botucatu, que se atrevera a colocar de volta no calendário esportivo da cidade uma modalidade esportiva como aquela. Mas não era apenas isso. Era um delicioso mergulho na minha própria vida de ex-adolescente. Explico: quando a primeira Volta Ciclística Internacional do jornal A Gazeta Esportiva passou por Botucatu, em 1963, eu já era bem velhinho em matéria jornalística. Trabalhava desde 1956. E aquilo tudo me arrebatou de tal maneira que, decorridos mais de 50 anos, pensei: não, a cidade precisa saber o que aconteceu na década de 1960 com esse esporte.

Cobri as etapas de 1963 e 1964, com a equipe da Radio F-8. Depois fui embora pra São Paulo em busca de meu destino. Mas aquilo não me saiu da mente e do coração, nunca mais. Quando chegou o ano seguinte, 1965, não deixei por menos. Levantei às 4 horas de uma manhã fria, para assistir a largada da terceira prova. Cruzei parte da av. São João, com seus bondes já rodando, dobrei à esquerda na Av.Ipiranga e à direita na Santa Efigênia, pra sair de cara com aquele templo do jornalismo esportivo, o prédio da A Gazeta Esportiva, na av. Casper Líbero.

Naquele lusco-fusco do amanhecer, quando as luzes da natureza ainda não clareiam e a noite ainda não foi embora, vi as equipes se aquecendo. De novo o forte cheiro do mentol esfregado nas pernas dos atletas, bicicletas ao chão aguardando a largada, dirigentes, batedores com suas harleys, equipes de apoio, treinadores e atletas. Todos com cara de tensão.

E eis que é dada a largada. Não há barulho algum no sair das bicicletas. Só mesmo os  motores dos veículos da imprensa e equipes de apoio são ouvidos. Não há atropelo, eles terão um longo trajeto a vencer, mas os  atletas nada falam. É quase um ritual, respiram ainda leve, mas fundo. Olham pra frente e se agregam aos demais componentes de suas equipes. E passam no seu “gingado de jogar o peso no pedal”, bicicletas balançado de um lado pro outro, camisetas de todas as cores, equipes com ar compenetrado cruzando os trilhos dos bondes que ainda esperavam a largada para iniciarem a passagem por ali.

Olhei em volta, talvez uma centena de espectadores, ou nem isso, olhando, curiosos “no quase dia” a parafernália de equipamentos que iniciavam o comboio.

Pensei comigo: foi o mais perto que cheguei da organização dessa prova. E fui embora satisfeito pensando voltar no ano seguinte, quem sabe.

Talvez a notícia da largada da mais importante prova ciclística do calendário de A Gazeta Esportiva tenha saído na edição do mesmo dia, mais tarde. Não lembro. Quando pude, talvez na noite daquele mesmo dia, corri comprar a Gazeta Esportiva. A largada estava lá, numa foto de capa, enorme, trazendo a atmosfera do momento. Ou talvez tenha sido eu, imaginando que uma simples foto pudesse mostrar tudo o que eu havia sentido.

Nunca mais cheguei tão perto daquela prova, que eu amava tanto. Por isso mesmo, quando a oportunidade deu-se, no século XXI, de voltar a ver aquela organização, mesmo já sob outra denominação, cruzar as ruas da nossa cidade, quis contar o quanto ela foi importante para a cidade…e para mim mesmo.

Daí nasceu o texto que pode ser visto a seguir.

 

 

Iniciada em 1963, a competição reuniu equipes do mundo todo apresentando aos paulistas e brasileiros um esporte de estrada, que é a coqueluche da Bélgica. Franca e Espanha, países que amam o ciclismo como amamos o futebol.

     Vi os competidores chegarem a Botucatu, naquele alvoroço todo de equipes, técnicos, massagistas, dirigentes, caminhonetas de apoio, vans com dirigentes, e jornalistas, muitos jornalistas.

Ao cheiro do mentol das massagens se juntou o suor dos competidores e a emoção da chegada, disputada a plenos pulmões, coração e músculos.

Não estávamos numa época muito boa. A cidade era pequena e mal alcançara 40 mil habitantes; não estava asfaltada na sua inteireza, ainda não estava bem iluminada. Mas era a nossa cidade e, orgulhosa, a população acorreu para as ruas, a ver passar o multicolorido das equipes.

Foi um acontecimento, o primeiro de uma série. Dias antes, a equipe do jornal A Gazeta Esportiva, dirigida pelo Carlos Joel Nelli, irmão do dirigente teatral botucatuense Armando Joel Nelli, condutor do movimento pela edificação do Teatro do Grupo TAENCA (Teatro Amador da Escola Normal Cardoso de Almeida), estivera na cidade. Em julho Carlos Joel Nelli, fora convidado pelo sr. Plínio Paganini, prefeito Municipal, através do Departamento Municipal de Turismo, para combinar os pormenores do evento. Diz o jornal A Folha de 13 de julho daquele ano: “…é sem dúvida uma ótima oportunidade que teremos de propagar o nome de nossa cidade, pois hospedaremos, juntamente com os atletas participantes, grande número de jornalistas e representantes de diversos canais de televisão que acompanham esta promoção da Gazeta Esportiva.”

Noticiando o acontecimento, a posteriori, o jornal “O Correio de Botucatu” foi claro: “Como frisou o repórter do jornal A Gazeta Esportiva, a recepção aos ciclistas em Botucatu, foi uma das melhores de São Paulo, Faixas foram colocadas em toda a extensão das ruas, saudando os rapazes do pedal…dos edifícios soltavam milhares e milhares de papeizinhos, com os dizeres: “Botucatu saúda os atletas”. Nossa cidade está de parabéns, soube recepcionar as caravanas de atletas que aqui aportaram…”,

Estas palavras são válidas para hoje e, tive o prazer de ler pelo Diário que o Secretário de Esportes tem o mesmo juízo feito pelos jornalistas da Folha de Botucatu daquela época: é preciso aproveitar a oportunidade.

A cidade mudou muito, se compararmos àquela da época: triplicou de tamanho; suas ruas, agora, estão quase todas asfaltadas; tem boa iluminação; arborização em expansão e beleza cênica necessária às objetivas das TVs e Jornais. Ademais, aumentou a oferta de vagas em hotéis, melhorou a oferta de serviços de todos os tipos (saúde, educação e transportes), e a vida noturna se espalhou pelos novos centros comerciais (av. Vital Brasil, Dante Delmanto, Leonardo Vilas Boas, Dom Lúcio e outros). Descentralizou-se.  E mais, as repetidoras de TV estão funcionando bem (coisa que não existia à época, pois as emissoras eram captadas direcionando as antenas VHF para S.Paulo); os serviços telefônicos estão modernizados pelas novas tecnologias e serviços via satélites.

Essas coisas não existiam naquela época. E tornaram difíceis nossas pretensões e visibilidade. Hoje, decorridos 50 anos, é possível e será imperioso mostrar nossas vantagens, expondo às equipes o coração da cidade. É isso que vai marcar os tapes rodados no perímetro urbano. É a beleza do casario, das edificações públicas e privadas, religiosas ou civis. A disposição das ruas e o desenho de uma cidade que chegou ao século XXI vencendo obstáculos, diante dos quais outras cidades feneceram. Foi uma tarefa hercúlea a reinvenção de Botucatu, que ressurge como centro universitário por excelência, que se consolida como centro de oferta de serviços médicos, públicos e privados e, também, como centro industrial consolidado.

O nosso povo, normalmente recebe bem, apoia os eventos esportivos e deverá fazê-lo novamente. Mas será preciso agradar ainda mais os dirigentes visitantes, mostrando o potencial da cidade para o esporte, mostrar o que temos de melhor.

1963: A Iª VOLTA INTERNACIONAL
chega a Botucatu

   Em 18 de julho de 1963 os atletas chegaram no coração da cidade, realizando a disparada final pela Avenida Floriano Peixoto. Diz o jornal A Folha de Botucatu de 20 de julho daquele ano: “Chegaram quinta-feira a Botucatu os ciclistas da 1ª Volta Ciclística Internacional do Estado, que foram recepcionados pelo povo da cidade, que se postou nas calçadas da nossa principal via, tendo sido recebidos no ponto de chegada por diversas autoridades locais.

“Essa grandiosa prova promovida pelo jornal A Gazeta Esportiva, e patrocinada pela Cia Antártica Paulista, vem empolgando grande parte do Estado; por onde passam os pedalistas são recebidos por calorosa recepção.

“Os ciclistas cumpriram a 10ª etapa, no percurso Bauru-Botucatu, com passagem por Agudos e São Manoel, onde foram entusiasticamente saudados pelo povo.

“No trecho compreendido entre Lençóis Paulista e São Manuel, o ciclista chileno Garcia acidentou-se, sofrendo algumas escoriações, tendo inclusive o seu veículo avariado, o que fez com que o mesmo deixasse de cumprir parte da 10ª etapa.

“Precedidos por batedores da Polícia Rodoviária os ciclistas, à medida que foram chegando, recebiam a bandeirada do prefeito municipal, que se encontrava postado na linha de chegada, na Praça Coronel Moura.

“O primeiro a cruzar a linha de chegada foi o argentino Delmo Delmastro, que fez o percurso Bauru-Botucatu em 2h52’2”. Esse grande ás do pedal, nos últimos dois mil metros, empreendeu um “rush” sensacional, ultrapassando o pelotão de brasileiros que vinha liderando a prova desde a saída de São Manuel, deixando para trás também o seu patrício Hector Acosta. Em terceiro chegou o brasileiro Nelson Consentino, da equipe “Caloi A”., brigando num pelotão para obter a colocação. O quarto e o quinto lugares também pertenceram aos brasileiros, com Eduardo Puertolano, da “Monarck” e Roberto Barbosa, da “Caloi A”.

A Argentina liderava a prova. Até Botucatu Hector Acosta, individualmente, liderava a prova, mesmo sendo o segundo a chegar à linha final em Botucatu.  Ganhava quase todas. Seus atletas vestiam a camiseta do líder, eram homenageados e homenageavam. Naquela tarde foram à prefeitura para os procedimentos de sempre: ganharam honrarias do prefeito Plínio e o principal atleta (Acosta) agradeceu a acolhida.

No dia seguinte, às 8 horas da manhã, partiram para cumprir o percurso Botucatu-Tietê e depois a Sorocaba e, em seguida a São Paulo. Usaram a Rondon, inclusive na serra, onde as bicicletas alcançaram velocidades arriscadas, forçando os veículos das equipes de reportagem de jornais, revistas e tvs, além das duas Emissoras AM locais, arriscarem nas curvas.

Ao final a cidade queria mais: “que viesse a IIª Volta Internacional de A Gazeta Esportiva. E ela veio…”

 

1964: A 2ª Volta Ciclística de A Gazeta Esportiva

    O sucesso da primeira edição da prova entusiasmou os organizadores. Em julho do ano seguinte (1964) vieram a Botucatu, buscando contato com a prefeitura e imprensa local. Liderando a equipe organizadora estava Aurélio Belloti, jornalista de A Gazeta Esportiva, fundação que chamara a si a responsabilidade de organizar a primeira prova. Circularam pela cidade, visitaram o coordenador de turismo, foram ao prefeito e escolheram novamente a Praça do Paratodos para a chegada dos atletas.

O perfil da etapa

Como no ano anterior a etapa entre Bauru e Botucatu seria uma prova dedicada à longa distância, sem escaladas de montanha, sem cronômetro medindo desempenho de curta distância e etc. Mas, seria uma prova enfrentando as mesmas dificuldades: não havia pista dupla, e a ligação entre as duas cidades, mesmo com asfalto, tinha problemas. A estrada precisaria ser interrompida, pois as equipes e atletas utilizariam uma das pistas da estrada – a de sentido interior/capital – para chegar ao seu destino. Havia um bom dispositivo da Polícia Rodoviária, que compunha um esquadrão de elite com batedores transportados em velhas Harley Davidson, poderosas e eficientes.

Mas a dificuldade principal continuava sendo a estrada.

A prova se internacionalizaria ainda mais

     Portugal foi a grande estrela da prova. Naquele ano de 1964, a etapa ligando Bauru a Botucatu ocorreu na manhã de 24 de julho. Mês de muito frio, fato que facilitou sua longa disputa de quase 100 quilômetros, num trecho relativamente rápido. Até então, na primeira etapa, ligando São Paulo a Campinas, havia vencido Antonio Carlos Orcia, da Monarck; na segunda etapa, entre Campinas e Araraquara, vencera o corredor português Laurentino Mendes, vencendo os 200 quilômetros de estrada; na terceira etapa percorrendo o trecho entre Araraquara e Ribeirão Preto, Claudio Rosa – brasileiro – foi o vencedor; na quarta etapa venceram os argentinos, na pessoa do atleta Delmo Delmanto, no trecho entre Ribeirão Preto e Barretos; e, na etapa entre Barretos e São José do Rio Preto venceu o atleta da Caloi Giuseppi Sunseri, brasileiro também; na 6ª etapa, representando Portugal, venceu o atleta Alcino Rodrigo, fazendo o percurso entre Rio Preto e Penápolis; na etapa seguinte, a sétima, entre Penápolis e Tupã, venceu o corredor português, Souza Cardoso (considerado um dos mais sérios concorrentes ao título individual); na 8ª etapa cobrindo o trajeto entre Tupã e Marília, venceu o brasileiro Antonio Fanocchi, da  equipe da Pirelli  brasileira; cobrindo a nona etapa, entre as cidades de Marília e Ourinhos, venceu José Corvo, novamente de Portugal, o bicho papão da competição daquele ano; e na etapa seguinte, a 10ª, vencendo o percurso entre Ourinhos e Bauru, novamente os argentinos paparam a competição, chegando em primeiro lugar o atleta Roberto Brepp e por fim, na etapa entre Bauru e Botucatu, foi a vez dos uruguaios subirem no primeiro lugar do pódio: venceu Alberto Ferrazan, Uruguaio.

A prova ganhara corpo, as distâncias haviam aumentado, o raid cobrira quase todo o Estado, incluindo cidades que antes não figuravam. E, haviam chegado os argentinos, portugueses e uruguaios. Os portugueses visitavam pela primeira vez a cidade,local de forte colônia lusitana. Tiveram direito à recepção feita pelo vice-consul português local, sr. Cardoso, descendentes dos antigos moradores locais. E a população desceu toda para a praça do Paratodos.

De volta às estradas

     No domingo, 26 de julho de 1964, a cidade tinha outras preocupações, também. Seus times de futebol estreariam nos campeonatos paulistas da primeira e da segunda divisões de profissionais. A AAFerroviária receberia o São Bento de Marília e a AABotucatuense receberia o Bauru Atlético Clube. Eles não sabiam ainda, mas venceriam. A Ferroviária iria derrotar o São Bento por 2 X 0 e a Botucatuense venceu por 1 X 0. E, a cidade respirava outros esportes, também: o E.C. Centenário programava suas corridas ciclísticas, com a  1ª prova ciclística “Octacílio Paganini”, em homenagem ao presidente da Câmara, e a 1ª prova pedestre “José Ananias Filho”, estava programada para ocorrer à noite, na Av. Dom Lúcio. O restante do dia correu normal: os jornais falavam do hino nacional, que deveria ser cantado por todos ou, então, por ninguém; o Conservatório Musical Santa Marcelina acabara de ser elevado à condição de ensino superior, as cápsulas espaciais Mercury e Gemini, eram estampadas pelos jornais na fábrica MacDonnel, Missouri, a estrada da cana seria terminada finalmente, e as procissões em homenagem à padroeira ocorreriam no final do dia, após missas e bênçãos. Dom Henrique, arcebispo, publica um longo artigo em louvor à Santa Padroeira, cujo dia seria comemorado.

Mas a manhã foi da Prova Ciclística Internacional de A Gazeta Esportiva. Vasta massa de moradores acorreu à rua Amando de Barros, por onde passariam os atletas, As, equipes reunidas, de volta à estrada Marechal Rondon, tomariam o rumo da cidade de Itú, como da primeira edição, no ano anterior, num dos mais longos percursos a serem vencidos: 120 quilômetros. Nenhum lance muito íngreme. Não haveria montanha a ser vencida, mas lances longos, que exigiriam um trabalho de equipe, feito de forma a poupar seus atletas para a chegada e a disparada final, conhecida pelo nome de ”sprint”, aquele momento em que o atleta escalado para poupar energias, toma a frente e vai para o final da prova dando tudo que pode. A equipe, de fato, chama equipe porque trabalha para isso. E o melhor velocista é o escolhido para chegar ao final com uma vitória. A enciclopedia Wikipedia tem uma boa definição para a palavra: Sprint, no ciclismo de estrada, é uma disputa entre vários ciclistas no trecho final de uma etapa ou nas proximidades de uma meta intermediária. Comumente, os ciclistas praticam um grande arranque, de modo a desenvolver uma grande velocidade por um curto período de tempo, com a finalidade de vencer a etapa ou conseguir as bonificações distribuídas pela organização do evento nas metas intermediárias (também conhecidos como sprints  intermediários).

De novo, a descida da serra, a estrada estreita, pista interrompida, guardas rodoviários, motonetas harleys davidsons, vans, repórteres, gente que a cidade daquela época não estava acostumada a ver, ouvir e conversar. Os atletas passam em disparada, no início da manhã. O silêncio dos que conduziam as bikes especiais mistura-se, novamente, com o alvoroço das equipes e novamente, o cheiro do mentol tomou conta do ar daquela manhã. Estava terminando um dos mais sensacionais eventos esportivos que a cidade já viveu e ainda viveria, até que a prova se esgotasse e deixasse de funcionar, definitivamente..

“O presidente da Comissão Central de Esportes, Plínio Paganini, e presidente da Comissão de Turismo, recebe Aurélio Belotti, julho/64, planejando a prova dentro da cidade. À esquerda Dr. Agnelo Audi, delegado seccional. À direta Élcio P Paganini, diretor da rádio F-8”.
Ciclista português é homenageado pelo vice-consul português em Botucatu, Manuel das Graças Cardoso, ambos sendo entrevistados pelo jornalista e homem de rádio Plínio Paganini”

 

VOLTA CICLISTICA DE “A GAZETA ESPORTIVA”

1965 – 1966 – 1967 -1968

Nossa cidade ficou vivendo as emoções das provas ciclísticas para estrada até o final daquela década, ou quase isso. Eram os últimos anos como capital regional (Botucatu, até 1969, foi sede de região administrativa do Estado, como são hoje Campinas, Sorocaba, Ribeirão Preto e outras prósperas cidades) e o novo ciclo inaugurado com a instalação das Escolas Universitárias tornava eufórica a Botucatu daqueles tempos. As vitórias nos jogos regionais, as conquistas nos jogos abertos, a vontade de chegar à divisão principal do futebol profissional paulista completava-se com o simples fato de mantermo-nos como etapa do principal certame paulista de ciclismo: A Volta Internacional do jornal A Gazeta Esportiva

O governo do Estado inclui a competição no seu calendário

    A competição foi ganhando expressão e visibilidade. As imagens corriam as páginas da Gazeta Esportiva, os microfones das emissoras de rádio e os sinais das primeiras emissoras de TV que chegavam ao interior. Em outubro de 1967 o governador Roberto Costa de Abreu Sodré resolve incluir a competição no calendário oficial. Há cinco anos ela vinha ocorrendo e, então, dada à sua grandiosidade, pela lei n.48.650 de 12 de outubro de 1967, oficializou-a com o nome de “VOLTA CICLISTICA INTERNACIONAL’

A III VOLTA, novamente em Botucatu1965

     A Terceira Volta Ciclística Internacional retornou à cidade. Agora maior, com um trajeto percorrendo 58 cidades, Botucatu viu, de novo, os atletas pernoitarem na cidade. Em junho o trajeto dentro de Botucatu já estava conhecido: vindos de S. Manoel, entrariam pelo acesso que hoje se chama Dante Delmanto. Não era duplicado e nem oferecia a segurança dos dias de hoje. Dos altos da cidade, dobraria à esquerda na Floriano Simões, tomaria a Major Matheus, ainda pavimentada com paralelepípedos, ganhando a Floriano Peixoto para chegar à Praça do Paratodos, final da prova. No dia seguinte, sairiam dali mesmo e seguiriam pela Rua Amando, no sentido contrário ao fluxo, alcançando a Mal. Rondon e rumando para Itu, novamente. Novamente o jornalista da Gazeta Esportiva Aurélio Belllotti comandava o evento. Veio a Botucatu em maio e entregou o planejamento ao prefeito Amaral de Barros e ao presidente da Comissão Central de Esportes Plínio Paganini.

Em 9 de julho acontece a etapa de chegada a Botucatu. “com imensa massa popular postada na Praça Cel. Moura, realizaram-se na última sexta-feira, anteontem, as atividades relacionadas com a III Prova Ciclística Internacional que tem o patrocínio de “ A Gazeta Esportiva”. Desde às 9,00 horas populares se aglomeravam àquele logradouro afim de assistir à chegada dos atletas na 14ª etapa, Bauru-Botucatu. Precisamente às 10,55 horas chegava o vencedor da etapa, representante da Pirelli, o brasileiro Francisco que fez o percurso em 2 horas, 48 minutos e 4 segundos.

 

IV Volta, por um outro caminho – 1966

-o CORINTHIANS PAULISTA liderava a prova –

     No ano seguinte, em 1966, continuamos a fazer parte da prova. Mas a organização deu um salto ao incluir um outro roteiro. Mais difícil, incluindo trechos em terra, em estradas do Paraná e Minas Gerais. Em 26 de setembro daquele ano a prova chegou a Botucatu. Diz o jornal O Mirim Esportivo que era editado por Gregório Fazzio Neto e Francisco de Assis, que “precedidos pelos batedores da polícia rodoviária os dois primeiros atletas a cruzarem a fita de chegada foram João Roque (Portugal) e Álvaro Pachon (Colômbia) ambos numa renhida disputa na base do sprint nos últimos mil metros da prova. Cerca de 38 ciclistas chegaram a Botucatu, sendo que o CORINTHIANS PAULISTA lidera a prova.”

Como estavam competindo no sentido horário, vinham de Itapetininga, e seguiram para Bauru, ao contrário dos três primeiros itinerários. Seriam mais 107 quilômetros. A prova Itapetininga a Botucatu foi realizada num percurso de 192 quilômetros, fazendo com que fosse alterado o horário da chegada. Previsto para as 12 horas, os primeiros competidores começaram a chegar ás 13h30.

A camiseta amarela, a do líder, continuava com João Roque, português.

Bolinhas apareceram na IV Volta Ciclística”

Claudio Rosa foto estampada no Mirim Esportivo em 03 08 1966

  Havia uma razão para o atraso: o percurso era longo demais, as estradas não estavam boas, e faltou fôlego aos atletas. Aí é que apareceu o problema: alguns atletas estavam recorrendo a anfetaminas. Diz o jornal O Mirim Esportivo: “o assunto começou a ser comentado já na etapa Itapetininga a Botucatu, uma etapa dura ao extremo. Já na etapa Bauru a Jacarezinho (Pr), um argentino ganhou um dia de muita dificuldade, principalmente na parte final com 10 quilômetros de lama. No dia seguinte andou muito tempo em último lugar, porque não tinha forças ou porque precisava pedalar menos, para recuperar o corpo cansado pelas bolinhas. Casos como esse, que citamos como exemplo, surgiram diversos e em alguns deles com muito mais gravidade. O mercado de Methedrine, Maciton, Anedrine e outras anfetaminas foi grande durante a corrida. Bastava só um pouco de amizade entre corredores e técnicos para conseguir alguma coisa. Quando o estoque acabava as farmácias eram visitadas, mas em nenhuma delas os clientes eram atendidos” Chocante depoimento dos repórteres do Mirim Esportivo. Hoje o antidoping barra essas interferências..

A V VOLTA – 1967

    Os jornalistas Aurélio Belotti, Tito Neto e Rubens Monzillo voltam, novamente, em agosto de 1967 e apresentam seu plano à prefeitura. São recebidos pelo prefeito Amaral e pelo presidente da Câmara Octacílio Paganini. Naquele ano a prova iria percorrer 2 mil e 200 quilômetros, numa gigantesca maratona a ser vencida por suecos, italianos, portugueses, argentinos, uruguaios, chilenos e brasileiros. E, incluindo os  Estados de São Paulo, Paraná e Minas Gerais, em vinte dias de competição. Em Botucatu eles chegariam em 5 de outubro, cumprindo a 13ª etapa, voltando a fazer o trajeto Bauru-Botucatu, 101 quilômetros e com chegada prevista para ocorrer entre 11 e 11h30 da manhã. Voltariam a entrar pela rua Jaguaribe, dobrando à esquerda (como antes) na Floriano Simões, dobrando á direita na Praça Cav. Virginio Lunardi, descendo a Major Matheus, Floriano Peixoto e Praça do Paratodos, local da chegada. A imprensa já anunciava a Concha Acústica como referência da praça do Paratodos, apresentando a nova configuração do jardim inaugurado em abril daquele ano. A prova foi realizada numa quinta-feira e o trajeto cumprido debaixo de chuva, entre Bauru e Botucatu, para a 13ª etapa apontou uma vitória do atleta Roberto Breppe da equipe da Caloi.  Em 2º,  Fernando Mendes, de Portugal e em terceiro lugar Waldemar Arbalo da Caloi.

A VI VOLTA – 1968
E deu Portugal outra vez

     A VI VOLTA CICLISTICA DE A GAZETA ESPORTIVA foi realizada, mesmo sendo aquele um ano nervoso, de eleições municipais disputadíssimas, greves operárias, greves e movimento estudantis universitários locais, movimento de religiosos e etc.  Anunciada para 29 de novembro vinha sendo disputada em meio aos tumultos da capital e do interior. E os portugueses continuavam liderando. Agora era a vez do corredor Miranda, que liderava o cômputo individual. Sob o título “E deu Portugal outra vez”, o Correio de Botucatu estampa a cobertura: ”Jorge Páscoa bisou o feito de outros corredores lusitanos, mantendo a tradição de vitórias de Portugal nas etapas de Botucatu. Quinta-feira, mesmo com muita chuva e outras dificuldades, o corredor português tornou-se vencedor do roteiro Bauru-Jahu-Botucatu, em um total de 199 quilômetros e 800 metros, com o tempo de 5 horas, 32 minutos e 28 segundos. A chegada deu-se na praça do Paratodos e mostrou bom sprint na reta final vencendo com categoria aos outros dois classificados nos primeiros postos: Leocádio (Portugal) e Flôres (Monarck). O pelotão surgiu depois dos vencedores com uma diferença de 9 minutos, mas isso não influiu na classificação individual. Roberto Sorlini, da Itália,  permaneceu com a camiseta amarela….”.